O presidente Jair Bolsonaro disse nesta quinta-feira (7) ter pedido ao Ministério da Saúde o recolhimento de uma caderneta de saúde do adolescente que contém imagens que mostram como prevenir a gravidez e doenças sexualmente transmissíveis.
No lugar, afirma, o governo deve fazer uma nova cartilha, "com menos páginas, mais barato e sem essas figuras" -sinalizando que os trechos de prevenção sairiam do material.
Em vídeo divulgado nesta quinta, Bolsonaro diz que foi informado sobre a publicação após ver um vídeo em que uma mãe reclamava do material, que ele chama, por engano, de "caderneta da vacinação".
Para Bolsonaro, no entanto, o documento "mostra certas figuras que não cai bem para meninos e meninas de 9 anos terem acesso".
A publicação, chamada de "Caderneta Saúde do Adolescente", foi lançada em 2008. O objetivo é informar meninos e meninas de 10 a 19 anos sobre cuidados básicos em saúde, a importância da vacinação, transformações do corpo na adolescência e métodos de prevenção à gravidez e doenças sexualmente transmissíveis.
Com 40 páginas, a publicação traz versões diferentes para meninas e meninos. Ambos os materiais, porém, frisam a adolescência como um "momento importante da vida" e de transformações. "Esta caderneta de saúde foi feita para apoiar você nesse processo de autodescoberta e autocuidado", diz o texto.
"Tem muitas informações boas aqui, precisas. Mas o final dela fica complicado no meu entendimento", afirmou, apontando para páginas com orientações de como utilizar a camisinha e com imagens do órgão feminino. "Se você pai ou mãe achar que não [tem problema], é direito teu. Sugestão primeiro é dar uma olhada e se achar complicado, tira essas páginas."
Logo em seguida, porém, ele afirma que combinou com Mandetta que o material será recolhido e substituído por uma nova cartilha.
Em nota, o Ministério diz que vai seguir as orientações do presidente. À Folha de S.Paulo, o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, confirmou que o documento será revisto. Em entrevista, porém, evitou confirmar o recolhimento por ainda não ter analisado o material.
Para Mandetta, o problema pode não estar na caderneta em si, mas na faixa etária a qual é recomendada. "Vamos rever. É aquela linha-fina entre a linguagem e o público-alvo. Quando se fala em adolescente, tem gente que entende essa adolescência mais tardia, após 14, 15 anos. Tem que ver a calibragem de qual o conteúdo e qual a faixa etária que está se falando", afirmou. "Se eu uso uma cartilha numa turma de 9 anos, o erro pode não estar na cartilha, mas na abordagem que foi feita."
Questionado se possíveis mudanças não representariam um veto do governo a ações de educação sexual, consideradas fundamentais por especialistas para prevenir a gravidez na adolescência, Mandetta disse que ainda não poderia comentar quais medidas serão adotadas.
"Temos o problema da gravidez na adolescência e das doenças sexualmente transmissíveis. Talvez essa cartilha esteja sinalizando que o programa está descalibrado. Pode ser que esteja usando a linguagem errada, uma linguagem para o público A para o público B."
Ainda de acordo com o ministro, a discussão começou após o vídeo de uma mãe que reclama pelo documento ter sido entregue a sua filha de 9 anos -a caderneta, no entanto, é indicada para crianças de 10 a 19 anos.
"Talvez essa mãe esteja certa no caso da filha dela. Não podemos pré-julgar", disse ele, para quem as variações na adolescência tornam difícil a avaliação. "Adolescência é marcada pela fase hormonal. Tem gente com 10 anos que já é mocinha, já tem menarca. E tem gente com 13 que ainda não. É uma faixa etária sensível de transição."
Questionado, o ministério disse que não houve distribuição das cadernetas neste ano. A pasta não informou dados dos anos anteriores.
'IRRESPONSABILIDADE'
O professor de saúde coletiva da Unifesp e ex-ministro da Saúde na gestão de Dilma Rousseff, Arthur Chioro, classificou a possibilidade de recolhimento do material como "irresponsabilidade". "É lamentável quando alguém coloca suas convicções pessoais acima do interesse público", afirma.
Segundo ele, o material tem sido usado nos últimos anos por municípios, em parceria com unidades de saúde e escolas, sem que haja críticas ou problemas. "É um material importante e muito seguro. Não é uma construção amadora. Ele trabalha lastreado em evidências científicas. Não são gestores que desenvolvem esse tipo de material, mas sociedades de especialistas", disse.
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