O 27ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio aceitou a denúncia contra o médico francês Gilles David Teboul, acusado de injúria racial, ameaça e agressão contra o porteiro Reginaldo Lima, do prédio onde mora, em Copacabana, na Zona Sul do Rio.
O caso aconteceu no dia 5 de julho. Gilles foi acusado por ter usado expressões como “negro” e “macaco” ao se dirigir ao porteiro para reclamar de um problema no elevador.
A decisão é do juiz Flávio Itabaiana de Oliveira Nicolau, que também negou o pedido de autorização para que o médico viaje para a França no dia 24 de julho. O juiz indeferiu, ainda, o pedido da defesa de Gilles para que o processo tramite em segredo de Justiça.
O magistrado também não autorizou a viagem do réu para a França, marcada para o dia 24 de julho e negou o pedido de devolução do passaporte do médico, que se encontra acautelado na 12ª Delegacia de Polícia.
“A ida do réu à França criaria óbice à rápida instrução criminal (o réu tem direito de presença na audiência de instrução e julgamento e haveria dificuldade de intimá-lo para o ato estando em outro país) e colocaria em risco a aplicação da lei penal em caso de condenação, já que poderia não mais retornar ao Brasil", escreveu o juiz.
RJ2 teve acesso ao depoimento do médico francês na delegacia. À polícia, ele disse que a viagem marcada este mês para a França, na Europa, seria para tratar problemas de saúde.
No dia 7, Gilles David ficou cerca de uma hora na 12ª DP (Copacabana). Com viagem marcada para o dia 24 deste mês para a França, o médico foi obrigado por decisão judicial a entregar o passaporte para não deixar o Brasil.
Na delegacia ele disse que precisa ir para a França no período estipulado porque toma remédios que só são comercializados lá - e seriam de extrema importância para a saúde. Entretanto, perguntado pelos policiais quais seriam os medicamentos, o médico disse que só falaria em juízo.
Também de acordo com o relato, em janeiro em 2022 ele comprou as passagens para ir à França sem nenhuma intenção de fugir de qualquer responsabilidade penal.
Sobre as acusações de xingamentos com termos racistas, Gilles disse que se dirigiu a Reginaldo e falou: "Por que não fechou bem a porta do elevador?". Como resposta, segundo o médico, ouviu do porteiro a seguinte frase: "Pergunta à sua mãe".
Naquele momento, de acordo com o francês, ele se aproximou do porteiro, mas sem tocá-lo. O médico afirmou aos agentes que se aproximou do funcionário e disse: "Você não tem competência para fechar a porta. Não deve trabalhar aí".
Ele negou no depoimento ter agredido Reginaldo e também disse que não xingou o porteiro.
As imagens das câmeras de segurança do prédio mostram o momento em que o o francês empurra com as duas mãos o pescoço do porteiro Reginaldo Silva.
Os vídeos registram, ainda, que, depois disso, o médico, gesticulando bastante na mesa em que o porteiro fica, vai para cima de Reginaldo. Entretanto, as câmeras não gravaram o áudio da conversa.
Ainda assim, uma moradora que aparece nas imagens confirmou que Gilles David usou termos racistas ao se dirigir ao porteiro.
Ao deixar a delegacia, na quinta, o francês foi agressivo com as equipes de reportagem. Já dentro do carro, continuou mostrando irritação.
Uma das ameaças feitas pelo francês contra o porteiro Reginaldo pode ter ficado gravada na câmera do policial que atendeu o caso. A delegada espera só a entrega das imagens pela Polícia Militar para concluir o inquérito.
Gilles David é investigado pelos crimes de ameaça, lesão corporal e injúria racial.
Repórteres empurrados
Na saída da delegacia, Gilles David empurrou repórteres e cinegrafistas, e tentou esconder o rosto quando entrou no carro. Irritado, o médico chegou a dar socos no vidro do veículo na direção aos repórteres.
Na última quarta (6), a juíza Maria Izabel Pena Pieranti, do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, decidiu que o médico está proibido de deixar o país. Além de deixar o país, ele está proibido de aproximar-se do porteiro e de molestá-lo sob qualquer pretexto.
Para deixar o país, Gilles precisa de autorização judicial e a saída deve estar comunicada às autoridades de fiscalização das fronteiras por via aérea, marítima e terrestre.
Uma testemunha disse em depoimento que todo ano Gilles fica seis meses na França e os outros seis meses no Brasil, e que ele estaria com viagem marcada para o país de origem ainda este mês, podendo inclusive antecipar a viagem.
O passaporte do francês ficará sob a guarda da delegada Natacha Alves de Oliveira, da 12ª DP (Copacabana), responsável pela investigação.
O advogado de Gilles, Marcio Barros, disse que o cliente nega ter ofendido o porteiro e que o médico esclarecerá tudo, colaborando com a investigação.
Porteiro se afasta do trabalho
O porteiro que denunciou o médico por racismo pediu afastamento do trabalho nesta quarta (6) por falta de condições emocionais. Ele afirma que não consegue dormir nem comer.
Reginaldo Silva de Lima pediu licença por três dias, porque não está em condições de exercer as atividades na portaria.
O porteiro chamou a polícia e relatou ter sido ameaçado pelo morador Gilles David Teboul. Ele conta que estava atendendo um hóspede quando Gilles, que é francês, passou e chamou a sua atenção porque a porta do elevador de serviço estava aberta.
"Ele voltou e falou: 'Seu incompetente. Você não está vendo que a porta do elevador está aberta? Você não tem capacidade para fazer essa função. Seu negro!'", contou Reginaldo.
O porteiro disse ainda que foi agredido e ameaçado de morte pelo morador.
As câmeras do circuito interno de segurança registraram o momento em que Gilles empurra o pescoço de Reginaldo com as duas mãos. Essa não teria sido a única agressão física.
“Ele me chamou de negro, macaco, vagabundo. Falou que pela minha cor eu não tinha capacidade de exercer a função de porteiro”, disse Reginaldo.
O porteiro afirmou que as ofensas continuaram na frente dos policiais.
Reginaldo afirma que sempre que lembra o que aconteceu se sente mal e tem uma tristeza profunda. Ele afirmou que o sindicato que representa a categoria está ajudando-o com assessoria jurídica e atendimento médico.
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