O Ministério Público de São Paulo abriu inquérito para apurar suspeita de enriquecimento ilícito do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, entre 2012 e 2017, período em que ele alternou a atividade de advogado com cargos no governo paulista. A Promotoria já pediu a quebra de sigilo bancário e fiscal de Salles, mas a medida foi negada duas vezes pela Justiça estadual neste mês.
A investigação teve início em julho a partir de representação feita por uma empresa chamada Sppatrim Administração e Participações, que levantou suspeita sobre a evolução patrimonial de Salles com base nas declarações de bens que ele mesmo prestou à Justiça Eleitoral.
Em 2012, quando foi candidato a vereador pelo PSDB, Salles declarou possuir 1,4 milhão de reais em bens, a maior parte em aplicações financeiras, 10% de um apartamento, um carro e uma moto. Em 2018, quando saiu a deputado federal pelo Novo, foram 8,8 milhões de reais, sendo dois apartamentos de 3 milhões de reais cada, 2,3 milhões em aplicações e um barco de 500.000 – alta de 335%, corrigindo o valor pela inflação.
Em nota, a assessoria do Ministério do Meio Ambiente afirmou ao jornal O Estado de S. Paulo que o “patrimônio e os rendimentos do ministro foram sempre declarados adequadamente à Receita Federal” e que “a própria representação não traz nada diferente do que nelas constam”.
Durante quase metade do período sob investigação, Salles ocupou cargos no governo do Estado. Foi secretário particular do ex-governador Geraldo Alckmin (PSDB) entre março de 2013 e novembro de 2014, função pela qual recebia 12.400 reais líquidos, e secretário do Meio Ambiente na mesma gestão, entre julho de 2016 e agosto de 2017, com remuneração média de 18.400 reais.
No pedido de quebra de sigilo do ministro, ao qual o Estadão teve acesso, o promotor Ricardo Manuel Castro destaca que, em 2014, Salles alegou queda de seus rendimentos por causa do cargo público em um pedido à Justiça para reduzir a pensão paga aos seus dois filhos. Conseguiu decisão para diminuir o valor de 8.500 para 5.000 reais.
O promotor afirma que Salles atuou em dez casos como advogado no período e que “não foram encontrados” nos autos “valores de causa suficientes a ponto de justificar o recebimento de honorários em volume tal que pudesse amparar tal aumento patrimonial”.
O promotor menciona no pedido o fato da evolução patrimonial de Salles ter ocorrido no período em que ele foi acusado de fraudar o plano de manejo de uma área de proteção ambiental quando foi secretário em São Paulo para beneficiar empresas de mineração. O MP moveu ação que resultou na condenação dele por improbidade administrativa em dezembro de 2018. Ele nega responsabilidade e recorreu da decisão.
Além da quebra de sigilo, Castro solicitou a elaboração de um relatório do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) apontando que o órgão de controle já havia informado sobre a “existência de movimentações comunicadas compulsoriamente” relacionadas ao CPF de Salles, mas não enviou o relatório.
O pedido, contudo, foi negado nas duas instâncias da Justiça paulista. Em sua decisão, o juiz Marcos de Lima Porta, da 5.ª Vara da Fazenda Pública, afirma que o fato de o próprio ministro ter feito a declaração de seu patrimônio “já indica sua boa-fé” e que a evolução patrimonial ocorreu passado “razoável período”.
Autor de pedido de ação trava disputa com Salles
Autora do pedido de investigação sobre Ricardo Salles, a empresa Sppatrim Administração e Participações pertence à família de Luiz Eduardo Bottura, um engenheiro e empresário que há cerca de quatro anos trava disputas judiciais com o atual ministro do Meio Ambiente.
O litígio começou em 2015 e envolve uma disputa judicial de 200 milhões de reais entre a empresa de Bottura e a construtora Bueno Netto, para a qual Salles advogou no período entre suas duas passagens pelo governo.
O empresário, que figura em 151 processos no Tribunal de Justiça de São Paulo – a maioria como autor -, acusa o atual ministro de usar uma suposta influência com autoridades paulistas para tentar reverter uma decisão favorável à Sppatrim na câmara de arbitragem.
A partir de uma representação feita pela empresa da família Bottura, o Ministério Público estadual abriu, em 2016, uma investigação para apurar a suposta prática de improbidade administrativa de Salles no caso. Salles nega ter cometido qualquer irregularidade na atuação como advogado. A investigação ainda está em curso.
Em fevereiro deste ano, Salles disse em entrevista à rádio Jovem Pan que seu patrimônio cresceu com a compra de um duplex que foi desmembrado em dois imóveis no período em que era advogado e que a tese do enriquecimento ilícito é uma “grande mentira” disseminada por Bottura.
Um grupo registrou formalmente em São Paulo uma “Associação de Vítimas de Eduardo Bottura” com pessoas que se dizem atingidas pela “litigância abusiva” do engenheiro.
Bottura nega a prática. Diz que aciona a Justiça para se defender de falsas acusações e que no caso de Salles apenas “entregou as provas objetivas dos fatos sobre as atividades que ele (Salles) praticou nos processos que envolvem a empresa da família que, segundo ele mesmo, o deixaram rico”.
Procurado, o promotor Ricardo Manuel Castro disse que não se manifestaria porque o caso está sob sigilo.
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