O tempo de televisão e o fundo partidário são pontos muito visados entre políticos ao definir uma coligação ou uma aliança em período eleitoral. As uniões também envolvem candidaturas regionais e, muitas das vezes, posições ideológicas semelhantes. É o caso, por exemplo, da coligação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que terá nesta eleição a maior aliança de partidos de esquerda e centro-esquerda desde as eleições de 1994, com PCdoB e PV – que formam a federação “Brasil da Esperança” com a legenda petista -, PSOL e Rede Sustentabilidade – também através de uma federação –, PSB e Solidariedade. Mas nem sempre o posicionamento político determina como as legendas irão se unir em torno de uma candidatura. Há casos, como do PSD, de legendas que apoiam candidaturas favoráveis ao presidente Jair Bolsonaro(PL), Lula e Ciro Gomes (PDT) em diferentes Estados. Mais do que isso, há um exemplo bastante inusitado no Amapá, onde o ex-prefeito de Macapá Clécio Luís (Solidariedade) é apoiado pelo Partido Liberal (PL), pelo PT e pelo PDT. Se no plano nacional a aliança entre PT e PL é impensável, já que Lula e Bolsonaro polarizam a disputa pela Presidência da República, o exemplo que vem do Norte do país ajuda a explicar como as costuras estaduais seguem uma lógica própria. Outra composição bastante conhecida vem da Bahia, onde o Progressistas (PP), partido do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (AL), do líder do governo na Casa, Ricardo Barros (PR), e do ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira (PI), todos aliados do atual presidente, ocupa o posto de vice-governador na gestão Rui Costa (PT).
Um dos maiores exemplos de adaptabilidade no meio político é o Partido Social Democrático (PSD). Durante o primeiro trimestre, a legenda flertou com a candidatura do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (MG), à Presidência da República, mas desistiu semanas depois. Em manifesto publicado em suas redes sociais no dia 14 deste mês, o presidente nacional da sigla, Gilberto Kassab, explicou os caminhos que levaram o partido a não ter um candidato próprio ao Planalto e recomendou uma postura de “neutralidade” à legenda. “Foram ouvidos parlamentares (em todos os níveis), os dirigentes partidários, líderes de todos os cantos do país. A constatação é que não temos unidade para caminhar coligado com um candidato de outro partido”, disse. No entanto, no âmbito estadual, o PSD selou alianças com os candidatos que possuem as maiores intenções de voto à Presidência: Lula, Bolsonaro e Ciro Gomes (PDT), respectivamente. Em São Paulo, a sigla oficializou o apoio à candidatura do ex-ministro da Infraestrutura do governo Bolsonaro, Tarcísio Gomes de Freitas. Com a aliança, o partido também ficou com a cadeira de vice na chapa e indicou o ex-prefeito de São José dos Campos Felício Ramuth para o posto. “A partir de hoje [7 de julho], o PSD do Gilberto Kassab, se junta à missão de fazer São Paulo voltar a ser a locomotiva do Brasil”, publicou Tarcísio em suas redes sociais. Segundo pesquisa Datafolha realizada em 28 a 30 de junho, que contou com 1.806 entrevistados, Tarcísio está numericamente empatado com o governador de São Paulo, Rodrigo Garcia (PSDB), com 13% das intenções de voto, atrás do ex-prefeito da capital paulista Fernando Haddad (PT), que lidera com 34% da preferência do eleitor.
No Rio de Janeiro, o partido buscou viabilizar a candidatura de Felipe Santa Cruz, ex-presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), mas, ao final, embarcou na chapa do ex-prefeito de Niterói Rodrigo Neves, do PDT, também na condição de vice. Neves é aliado do candidato Ciro Gomes e esteve no palanque do PDT na cerimônia que selou a candidatura do pedetista ao Planalto. Na mais recente pesquisa Datafolha, o candidato apadrinhado por Ciro encontrava-se na quarta colocação com 6% das intenções de voto atrás, de Anthony Garotinho (União Brasil), com 7%, do atual governador Cláudio Castro (PL), com 21%, e do deputado federal Marcelo Freixo (PSB), que tem 22% da preferência do eleitorado. Garotinho, no entanto, não mais disputará a corrida pelo Palácio Guanabara, por decisão de seu partido. Já em Minas Gerais, segundo maior colégio eleitoral do país, o ex-prefeito de Belo Horizonte Alexandre Kalil (PSD) será o candidato da sigla para concorrer ao cargo de governador do Estado mineiro. Ele terá o apoio de Lula e do PT, que indicou o deputado estadual André Quintão para o posto de vice-governador. Kalil, inclusive, utiliza suas redes sociais para divulgar seu apoio ao petista e a união com o ex-presidente como trunfo da sua candidatura. No último levantamento realizado pelo Datafolha, Kalil aparece na vice-liderança das intenções de voto com 21% da preferência do eleitor mineiro, atrás apenas do atual mandatário, Romeu Zema (Novo), com 48%. A aliança do pessedista com o ex-presidente é vista como fundamental para que o ex-presidente do Atlético-MG ganhe musculatura na corrida eleitoral e evite, em um primeiro momento, a vitória de Zema no primeiro turno.
Da direita para a esquerda – e vice-versa
Nas eleições de 2019, o então deputado federal Jair Bolsonaro buscava uma legenda para disputar a cadeira de presidente da República. Depois de muitas idas e vindas, o empresário Luciano Bivar aceitou lançar o capitão reformado do Exército como candidato do Partido Social Liberal (PSL). Em seu primeiro ano como presidente, porém, Bolsonaro acertou a sua desfiliação do PSL após brigas internas com Bivar. Este, por sua vez, negociou com o Democratas (DEM) uma fusão, o que resultou na criação do União Brasil, partido que detém quase R$ 1 bilhão de fundo partidário e eleitoral e o maior tempo de televisão para esta eleição. Nesta eleição, Bivar anunciou que sairia como candidato ao Planalto e não dava sinais de que iria desistir. Nas últimas semanas, porém, Lula e seus emissários entraram em campo com a missão de atrair o União para a candidatura presidencial do petista, em um esforço para tentar liquidar a eleição ainda no primeiro turno. A aliança com o PT não deve ocorrer no primeiro turno, mas Bivar desistiu da postulação ao Planalto e lançou como presidenciável de sua legenda a senadora Soraya Thronicke (MS), que terá como vice o ex-secretário da Receita Federal Marcos Cintra.
Um caso emblemático de como as alianças ocorrem segundo a conveniência vem do Palácio do Planalto. O atual ministro da Casa Civil de Bolsonaro e um dos coordenadores da sua campanha à reeleição, Ciro Nogueira (PP-PI), não tem um histórico de caminhada ao lado de partidos de direita. Em 2014, Nogueira pediu votos à então candidata à reeleição Dilma Rousseff (PT). Na eleição após o impeachment, seu partido, o Progressistas, acertou apoio ao ex-governador de São Paulo, Geraldo Alckmin. Em sua corrida como senador, porém, foi possível encontrar outdoors e vídeos em que Ciro presta apoio a Lula e atrela sua imagem ao petista, a quem já chamou de “o melhor presidente da história do Brasil”. Ainda assim, após ser chamado pelo presidente Bolsonaro para integrar o governo, o senador aceitou o convite e passou a defender a atual gestão. Em 2017, porém, o expoente do Centrão classificava o atual chefe do Executivo federal como “fascista”. Nos últimos meses, Nogueira já realizou inúmeros disparos contra Lula em suas redes sociais. “O plano Lula para a economia é um acrônimo. É literalmente Limitado, Ultrapassado, Lamentável e Antigo”, disse no dia 7 de junho.
Da mesma forma, Lula rivalizou com Geraldo Alckmin nas eleições de 2006. Enquanto o petista buscava sua reeleição, o político de Pindamonhangaba, um dos fundadores do PSDB deixava o Palácio dos Bandeirantes para tentar chegar ao Palácio do Planalto. Com uma série de acusações de ambos os lados, o petista saiu vitorioso e o então tucano retornou à vida pública em São Paulo. Em 2018, porém, os dois se reencontraram nas eleições presidenciais e Alckmin acusou o ex-presidente de pleitear a volta à “cena do crime”. Em uma das alianças mais improváveis da história recente da política brasileira, Alckmin deixou o ninho tucano, acertou sua filiação para o Partido Socialista Brasileiro (PSB) e foi indicado para o posto de vice-presidente na chapa de Lula, em um acordo costurado pelo ex-governador Márcio França (PSB). No Rio de Janeiro, outra união pouco convencional foi selada nos últimos dias: o ex-prefeito da capital César Maia (PSDB), pai do ex-presidente da Câmara dos Deputados Rodrigo Maia (PSDB) foi escolhido para a vice de Marcelo Freixo.
O que explica?
Na visão de Denilde Holzhacker, professora de ciência política da ESPM, os partidos políticos brasileiros não se unem em decorrência de suas bases ideológicas, mas sim em torno de vantagens de seus líderes. “Há um alto grau de personalismo nos partidos e cada cacique político articula suas alianças em torno dos seus interesses eleitorais. Isso é mais crônico em alguns partidos, como no caso do PSD”, disse em entrevista à Jovem Pan. Segundo a analista, as legendas são costumeiramente utilizadas como plataformas para o lançamento de candidaturas sem que haja ligações programática entre crenças políticas dos candidatos e dos partidos. “Por isso, muitos políticos mudam constantemente de legenda, como observado com o Bolsonaro, por exemplo. Poucos partidos têm uma relação com suas bases de suporte, mesmo tendo certo personalismo ainda buscam alianças pelos lado programático. Alianças também são articuladas considerando o quanto de tempo cada partido terá no horário eleitoral gratuito.”, explica. Outro ponto a ser considerado é o sistema eleitoral, que faz com que o eleitor crie um vínculo com o candidato – e não com o partido. Sendo assim, mesmo com o cálculo eleitoral para divisão das cadeiras no parlamento, de acordo com Denilde, o sistema divide-se entre a votação partidária e personalista. “Para muito dos eleitores, sua relação é maior com o candidato”, argumenta.
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