De olho na dificuldade do governo em articular a reforma da Previdência no Congresso, empresários decidiram ir de vez para o "corpo a corpo" para garantir votos suficientes para aprovar a proposta.
A estratégia para reforçar o discurso a favor da "Nova Previdência" começa em campanhas nas redes sociais, passa pela pressão sobre deputados e senadores, pela abertura de um escritório de lobby em Brasília e até por um convite para ocupar uma sala dentro do Ministério da Economia.
Formado por um grupo de empresários que desde a corrida presidencial apoiou Jair Bolsonaro e as políticas do ministro Paulo Guedes, o movimento Brasil 200 lidera as iniciativas.
A entidade - que reúne empresários como Flávio Rocha (Riachuelo), Luciano Hang (Havan), Sebastião Bomfim (Centauro) e João Apolinário (Polishop) - tem procurado individualmente os parlamentares para recolher assinaturas dos que se comprometem a votar a favor da reforma. De acordo com o grupo, a lista já conta com 230 deputados e 10 senadores. A ideia é usar o documento para cobrar posteriormente a posição.
Para ampliar o rol de congressistas "aliados", o Brasil 200 vai abrir um escritório em Brasília. Além disso, segundo o presidente da entidade, Gabriel Rocha Kanner, a Secretaria da Previdência ofereceu um espaço para que o grupo participe da elaboração de ajustes à proposta.
A ideia é formar uma aliança com o governo para troca de informações, tanto sobre adaptações do texto quanto à possibilidade de aprovação, diz Kanner, que é sobrinho de Rocha, da Riachuelo. Procurado, o Ministério da Economia nega a concessão de espaço físico, mas confirma a parceria em dados.
Habituado a tentar influenciar políticas públicas, o Instituto do Desenvolvimento do Varejo (IDV), que reúne grandes empresas nacionais, realizou reuniões sobre a reforma da Previdência com líderes no Congresso e ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) ainda em 2018.
Agora, a ideia é dobrar a pressão. O instituto já teve três encontros com o secretário da Previdência, Rogério Marinho, e se prepara para abordar deputados e senadores. "A gente vê que a articulação política é muito importante", diz Antonio Carlos Pipponzi, presidente do IDV e acionista da Raia Drogasil, referindo-se aos "soluços" na discussão do texto.
Um dos aliados mais aguerridos do governo Bolsonaro, o dono da Havan, Luciano Hang, fará dupla jornada para tentar garantir a reforma da Previdência. Além de ser um dos integrantes do Brasil 200, iniciou nesta semana campanha própria nas redes sociais com o mote "Previdência ou morte". Para reforçar o argumento, marcou "live" no Twitter - onde tem 245 mil seguidores - para tratar do assunto.
Confiança
Três meses após o início do governo de Jair Bolsonaro (PSL), o voto de confiança do empresariado na aprovação reforma da Previdência, que era irrestrito, passou a ser relativo. O Estado conversou com mais de uma dezena de executivos e donos de empresas que renovaram o apoio ao texto do governo. No entanto, eles temem que o Executivo não tenha condições de angariar votos suficientes para aprovar as mudanças necessárias para que o País volte a atrair investimentos e retome o crescimento.
O apoio à proposta continua firme, mas há frustração com a paralisia em Brasília. "Há uma preocupação empresarial com essa crise institucional", diz Pedro Passos, acionista da Natura, referindo-se ao bate-boca entre Bolsonaro e o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, na semana passada. Para Flávio Rocha, dono da Riachuelo e um dos líderes do Instituto Brasil 200, o governo precisa abandonar o tom belicoso da campanha de 2018. "Agora é preciso aglutinar todos a favor da reforma."
Outro aliado do governo, o dono da varejista Havan, Luciano Hang, diz que deputados e senadores precisam ter clareza da gravidade da situação: "Sem a reforma da Previdência, o Brasil quebra. E ninguém vai querer investir em um país quebrado." Hang afirma esperar a aprovação da reforma para colocar em pé investimentos de R$ 3 bilhões até 2022 para expansão de sua rede. No fim do ano passado, havia anunciado aporte de R$ 500 milhões para 2019.
A união em torno da reforma da Previdência é vital, na visão de Pedro Wongtschowski, presidente do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), para que o País passe a oferecer algo que não conseguiu estabelecer nos últimos anos: a sensação de previsibilidade da política econômica. "Ainda não está claro como seguirá a relação entre Executivo e Legislativo. A aprovação relâmpago da PEC do orçamento impositivo deixou evidente a desarticulação do governo."
O presidente da gigante da celulose Suzano, Walter Schalka, diz ter sido bombardeado na semana passada por investidores chineses e americanos sobre a crise. "O Brasil precisa de novos investimentos. Quem ainda não está aqui, não vai colocar dinheiro no País agora diante dessas incertezas."
Frágil
Segundo Antônio Carlos Pipponzi, acionista da Raia Drogasil e presidente do Instituto de Desenvolvimento do Varejo (IDV), a bolha de euforia criada pela escolha da equipe econômica - capitaneada pelo ministro da Economia, Paulo Guedes - foi furada pela dificuldade de articulação do governo no Congresso. "Existe uma frustração, pois o apoio do Congresso se mostrou frágil e a aprovação da reforma, mais difícil do que se imaginava", afirma.
Ruptura de antigas práticas
Enquanto parte dos empresários diz que o governo precisa melhorar a interlocução com o Congresso e se abrir ao diálogo para aprovar a reforma da Previdência, alguns líderes de grandes empresas acreditam que ao menos parte dos "ruídos" na discussão da proposta está na difícil tarefa de derrubar antigas práticas na relação com entre o Executivo e o Legislativo.
Nesse grupo está Rubens Menin, presidente do conselho da construtora MRV. "O governo de Jair Bolsonaro representa uma ruptura com o passado. Já tinha expectativa que não seria muito fácil (aprovar a reforma). Estamos exatamente neste ponto (de inflexão)."
Outro nome da construção, Meyer Joseph Nigri, fundador da Tecnisa, minimiza a turbulência da semana passada como "espuminha" e frisa que Bolsonaro "quer paz". "Em toda mudança de governo, há ajustes a serem feitos."
O discurso de Menin e Nigri encontra coro em Alexandre Grendene, cofundador da fabricante de calçados Grendene. "O problema é que faz 20 anos que os governos vêm aumentando privilégios, principalmente de uma minoria. Mudar tudo isso é difícil porque ninguém quer perder privilégios. Precisamos ter um pouco de paciência para começar a ver os resultados deste novo governo."
Fiador do movimento liberal no País, Winston Ling, que tem negócios petroquímicos no Brasil e é dono de fintechs nos EUA, espera que Congresso e governo se acertem. "Aparentemente os dois lados são a favor da reforma. O ideal é que o governo aproveite seu capital político para aprovar as mudanças. Há uma discussão ainda do que é velha e nova política."
Ling diz acreditar que o governo tem potencial para aprovar o projeto. O empresário segue à risca a cartilha do economista Paulo Guedes - ele ajudou a aproximar o ministro da Economia do presidente.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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