O Ministério Público Federal (MPF) apontou a existência de "elementos suficientes" que podem levar à abertura de um inquérito civil para investigar a elaboração de um dossiê de monitoramento de opositores do presidente Jair Bolsonaro. O documento foi produzido pela Secretaria de Operações Integradas (Seopi) do Ministério da Justiça e Segurança Pública, na gestão do ministro André Mendonça.
Um procedimento preliminar – chamado notícia de fato – foi instaurado pela Procuradoria da República no Rio Grande do Sul, após a revelação da existência do dossiê pelo portal "Uol". O procurador da República Enrico Rodrigues de Freitas, que desempenha a função de procurador regional dos direitos do cidadão no estado, pediu informações à Seopi, entre elas uma cópia do relatório produzido pela secretaria.
O Ministério da Justiça se negou a fornecer o documento e disse que o caso, agora, é tratado diretamente pelo ministro da Justiça. Por isso, conforme a alegação da pasta, somente o procurador-geral da República, Augusto Aras, poderia oficiar Mendonça, em razão do foro privilegiado de ministros de Estado.
Em um despacho no último dia 13, o procurador afirmou existirem, tanto na resposta da Seopi ao MPF quanto no posicionamento do ministro da Justiça ao Supremo Tribunal Federal (STF), "elementos suficientes que possam indicar a necessidade de conversão da presente notícia de fato em procedimento preparatório ou inquérito civil". Entre esses elementos estão, segundo o MPF, a demissão do diretor de Inteligência do ministério, coronel Gilson Libório de Oliveira Mendes, e a instauração de uma sindicância para apurar as circunstâncias da elaboração do dossiê. Tanto a demissão quanto a sindicância foram determinadas por Mendonça, depois de a existência do dossiê se tornar pública.
Apesar da existência desses elementos, o procurador da República preferiu esperar o julgamento de uma ação sobre o assunto no STF. O presidente da Corte, ministro Dias Toffoli, marcou para a próxima quarta-feira a análise em plenário de uma ação do partido Rede Sustentabilidade que pede a interrupção do monitoramento dos opositores de Bolsonaro – são 579 pessoas, principalmente policiais antifascistas das mais diferentes instituições, como PMs, Polícia Rodoviária Federal (PRF) e Polícia Federal (PF).
O MPF decidiu sobrestar a notícia de fato, até a conclusão do julgamento pelo STF. O procurador responsável vai decidir sobre a abertura de inquérito com base no entendimento jurídico que for manifestado em plenário, assim como "delimitar o eventual escopo" de eventual inquérito com base na deliberação dos ministros do STF, como consta na decisão do sobrestamento.
Fontes ouvidas pelo GLOBO, que tiveram acesso a um relatório sobre o crescimento do movimento dos policiais antifascistas no Brasil, afirmam que a Seopi, no documento, apontou o avanço de movimentos antifascismo no Brasil, seguindo uma tendência verificada em outros países. A secretaria também alegou risco de violência e de participação de "black blocs" em protestos, apesar do caráter pacífico das manifestações feitas até agora; identificou policiais antifascistas; e colocou esses movimentos como ameaças à segurança nos estados.
O relatório foi difundido para os setores de inteligência das secretarias de segurança pública nos estados, segundo as fontes ouvidas, que falaram sob anonimato. Elas não descartam a possibilidade de que o relatório não seja exatamente o mesmo que listou 579 servidores da área de segurança pública e professores que fazem oposição a Bolsonaro.
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