Uma resposta incisiva que começou com "não vou falar sobre o assunto" e diz muito mais sobre um antigo conflito político no Flamengo do que o que foi perguntado.
Marcos Braz não se privou de fazer questionamentos ao projeto que prevê parceria com o Tondela, de Portugal. Comportamento que soou internamente muito mais como um recado para o vice de finanças, Rodrigo Tostes, do que explanação sobre o assunto.
Não é de hoje que os vices de futebol e de finanças caminham em direções distintas. É como se fosse um novo round do conflito entre Ninho do Urubu e Gávea, que já teve BAP como antagonista e agora tem em Tostes a figura que bate de frente com Braz. Guerra fria que vem desde o início da gestão Landim.
Há algum tempo o vice de futebol se vê como alvo do trio BAP, Tostes e Gustavo Oliveira, vice de comunicação e marketing, e os confrontos geralmente se dão mais de maneira velada do que direta. O episódio Tondela, que tem o vice de finanças como principal incentivador nos bastidores, é só mais um.
A resposta de quase três minutos de Marcos Braz para a pergunta "o Tondela está perto?" repercutiu nos corredores da Gávea e a percepção coletiva é de que foi exagerada. Dois pontos chamaram a atenção de maneira especial nas resenhas sobre o assunto.
O primeiro foi o fato de Braz nunca sequer ter se manifestado fosse no sentido de questionar ou no de se posicionar sobre a pauta. Após a coletiva de apresentação de Andreas Pereira, houve uma reunião de mais de uma hora do conselho de futebol sobre os rumos para reta final de temporada e planejamento para 2022, e o tema Tondela foi ignorado.
Outro ponto foi o fato de seu fiel escudeiro, Bruno Spindel, estar a par de tudo o que está acontecendo e Braz indicar não ter conhecimento mais profundo do andamento. O vice de futebol tratou o assunto como irritante e disse que "Landim nunca tocou nisso comigo".
Até agora Tostes não deu declarações públicas sobre o projeto em Portugal. A tendência é de que isso só aconteça após aprovação no Conselho, em setembro, e após o contrato estar assinado.
A relação entre Braz e Tostes começou a piorar no episódio da polêmica renovação de contrato de Diego Alves, no final de 2020. Na ocasião, o vice de finanças foi firme ao rechaçar o acordo inicial costurado por Bruno Spindel e deu início a um cabo de guerra que terminou com o goleiro flexibilizando até que o novo vínculo fosse definido.
A disputa pela autonomia nas ações do futebol continuou com o pulso firme na liberação de verba mantido na primeira janela de transferências, quando o Flamengo contratou apenas Bruno Viana. O clima esquentou novamente no episódio Rafinha.
O próprio lateral-direito declarou que Marcos Braz e Bruno Spindel demonstraram interesse na contratação e colocaram a responsabilidade dos rumos da negociação no departamento financeiro. Paralelamente a isso, houve críticas do departamento de futebol ao desempenho da vice-presidência de marketing na busca por patrocínio. No fim das contas, o jogador foi para o Grêmio.
A guerra fria continuou internamente e não foram poucas as vezes que Braz manifestou o incômodo sobre a interferência de dirigentes de fora do futebol nas tomadas de decisão da pasta.
Questionado na ocasião se era uma indireta para alguém por conta do velho conflito entre Ninho e Gávea, Braz disse:
- Passei da fase de ter preocupação com isso.
A cobrança pela geração de receitas antes de cogitar ir ao mercado, por sua vez, sempre foi algo que gerou ruído entre as sedes no Flamengo. O departamento de futebol se sentia exposto ao ser cobrado por saídas como as de Natan e Gerson, enquanto tratava-se de uma urgência para o cumprimento do orçamento.
Além disso, havia desconforto por não existir contrapartida. Por mais que tenha feito milhões com vendas como as já citadas e a de Rodrigo Muniz, a torneira segue fechada para maiores investimentos. Nesta janela, a boa relação com Giuliano Bertolucci, que tem ótima entrada em gigantes europeus, mais uma vez fez a diferença.
Andreas Pereira e Kenedy, por exemplo, chegam praticamente a custo zero e as tratativas com o Lyon por Thiago Mendes esbarraram justamente na torneira fechada. Do lado da Gávea, a postura é irredutível, o que muitas vezes incomoda. Não à toa, o sucesso na empreitada com "bolso vazio" foi tão comemorado pela dupla do futebol.
Acima do cabo de guerra, Rodolfo Landim conduz a situação com naturalidade e chama para si a responsabilidade da maioria das decisões, evitando que os conflitos cheguem a momentos mais agudos dos debates. Faltando cerca de quatro meses para as eleições, o favoritismo é grande no caminho para a reeleição e não é um problema que já dura quase três anos que tiraria o sono do presidente.
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