Em sabatina realizada na última terça-feira (04) na Fundação Álvares Penteado, em São Paulo, o candidato à presidência Ciro Gomes (PDT) comentou sua relação com o PT, sua posição acerca do impeachment da ex-presidenta Dilma Rousseff, sua opinião sobre a prisão de Lula e sobre os demais candidatos que concorrem à presidência.
"Agora, repare bem o que é o PT, ou o que é o governo Lula: o governo Lula é o governo que melhorou o poder de compra do salário mínimo de 76 para 320 dólares em oito anos; o governo Lula é o governo que ampliou o crédito de 17% pra 55% do PIB; o governo Lula é o governo que criou uma rede de proteção social que baniu a fome de mais de 40 milhões de pessoas que, tendo a rede de proteção social conhecida como bola família comem, não tendo, passam fome; esse é o governo Lula. Não sei qual é a opinião de vocês sobre este governo… Agora, eu também sei que o governo Lula é o governo que loteou a Petrobrás; que botou o Michel Temer na linha de sucessão; que conciliou com Renan Calheiros – e de novo está conciliando; que conciliou com o Eunício Oliveira e de novo está conciliando; é o mesmo governo que acertou-se com Eduardo cunha na presidência da câmera dos deputados; então a minha opinião sobre eles é isso", disse.
"Não sou obrigado a dizer agora que o PT é satanás ou que o PT é deus; que o Lula é satanás ou que o Lula é deus; ele não é nem uma coisa nem outra", afirmou.
Em vários momentos, Ciro posicionou-se não como político, mas como especialista ou, em suas palavras, “professor”, defendendo opiniões técnicas a respeito de assuntos jurídicos:
"Eu acho que a sentença que o condenou é frágil", disse o presidenciável a respeito da condenação de Lula.
"A sentença do Lula é a primeira que eu conheço no Brasil em que alguém é condenado por conjunto indiciário. Isso, [esse tipo de condenação] é uma escola anglo-saxônica do direito. É da escola do direito consuetudinário. Então, no mundo moderno, já existe a condenação por conjunto indiciário, mas o direito que vige no Brasil é um direito positivo, e especialmente no direito penal só vale o que está escrito. Não há na sentença do Sergio Moro, nas 81 páginas, nenhuma prova que identifique o Lula como culpado de corrupção passiva que é a condenação que ele recebeu", emendou.
Parte dos jornalistas presentes na sabatina não gostou das declarações do candidato e reagiu com insinuações, em tom irônico e jocoso, de que Ciro estaria sendo parcial. Irritado, o presidenciável respondeu com sua característica postura assertiva:
"Um minutinho só, estou falando de direito! Não estou falando de política. Eu sei que vocês são todos tarados contra ele [o Lula]. […] Mas a pergunta foi, o senhor acha que o Lula é um criminoso? Não dá para achar porque a sentença que o condenou neste momento é injusta", argumentou Ciro Gomes.
Em seguida, o candidato foi questionado se isso significa que, na sua opinião, o Lula teria direito de se candidatar e disputar as eleições.
"Claro que não. Por que? Porque o Lula optou por reconhecer o itinerário judicial, que supõe respeitar a lei. E o Lula pôs em vigor uma lei, que se chama popularmente de Lei da Ficha Limpa, que é transparente, clara e cristalina na sua interpretação, que não admite dubiedade: Qualquer cidadão condenado por crime contra a administração pública em segunda instância perde os direitos políticos. Então é simples assim", defendeu.
E qual seria a opção, segundo o direito, que não seguir o itinerário jurídico? Questionaram em seguida o candidato.
"Denunciar que o judiciário está organicamente no golpe, e repudiar o judiciário, pedir um asilo numa embaixada, levantar a população numa insurreição armada – tem 10 na história da América Latina. Ele optou por aceitar o rito legal, recorrer – e portanto reconhece o judiciário como instituição legítima", salientou o candidato.
Apesar de repetir diversas vezes que ele não se confunde com o Lula ou com os petistas, em outro trecho da sabatina, Ciro defendeu a necessidade de tomar lado, considerando a polarização que domina o atual cenário político brasileiro: "O problema é que a gente vive obrigado a reagir a estereótipos […] Agora o Brasil nestes últimos anos se dividiu entre coxinhas e mortadelas, eu bem que gostaria que isso não fosse assim, e eu tomo lado. Eu tomo o lado dos mortadelas."
Golpe
Especificamente sobre o processo de impeachment da ex-presidenta, Ciro não hesitou em afirmar: “a Dilma sofreu um golpe”.
"Não é que ela não estivesse fazendo um péssimo governo – ela fazia (sim) um péssimo governo e portanto desfinanciou a sua legitimidade na população. Só que fazer péssimo governo não é, como diz a lei, crime de responsabilidade. A Dilma não foi acusada de cometer crime de responsabilidade", afirmou Ciro Gomes.
E, mais uma vez, apoiou-se em um discurso técnico jurídico:
"Crime de responsabilidade está submisso ao princípio básico do direito romano que afirma nullum crimen, nulla poena sine praevia lege, quer dizer, “não existe crime nem pena sem lei anterior que os defina”. E aí eles forçaram a barra e pegaram um ajuste contábil, que não é uma das melhores práticas, mas que o Fernando Henrique fez nos seus 8 anos, que o Lula fez nos seus 8 anos, que a Dilma fez nos 4 anos antecedentes, que o tribunal de contas sancionou nesses anos todos de Fernando Henrique e Lula e botaram na Dilma esse truque contábil chamado pedalada fiscal e ela foi derrubada", acrescentou.
Por fim, concluiu o candidato: "Crime de responsabilidade ela não cometeu, portanto o Brasil está sob um golpe. Um golpe de estado à moda moderna, um “soft golpe”, um “soft coup”, porque não é mais a sargentada que no passado invadia o parlamento, matava as pessoas etc".
Bolsonaro e demais candidatos
Ao longo da sabatina, Ciro Gomes teceu comentários ácidos e críticos sobre os demais candidatos à presidência da república poupando apenas Guilherme Boulos.
"O Boulos me parece uma mudança importante, coerente. O que eu posso dizer do Boulos é que, para além de maravilhoso ele é muito jovem, nada que o tempo não resolva", disse.
Quanto ao candidato Jair Bolsonaro e sua liderança nas pesquisas, Ciro foi bastante otimista: "Lembre-se que quem está puxando o Bolsonaro são os ricos, os brancos e os machos (ou os homens). Que é basicamente esse lado mais truculento da sociedade, esse lado mais egoísta. Mas, daí até ele ganhar a eleição, eu acho que o povo Brasileiro não cometerá esse suicídio coletivo".
E prosseguiu com uma análise do candidato radical de direita, apontando-o como negação do diálogo e, portanto, da política:
"Eu acho que a elite brasileira é que está produzindo o Bolsonaro. Porque o Bolsonaro, ele está interpretando um papel. E a elite brasileira cobra ele no texto que ele decorou. Qual é o papel do Bolsonaro? ele quer negar a política. Como diálogo, como tolerância, como virtude do pluralismo. Então ele manda ver 'bandido bom é bandido morto'. Isso é uma reposta tosca para uma sociedade que está com medo no coração."
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