O Supremo Tribunal Federal (STF) pode retomar, nesta quarta-feira (14), o julgamento de uma ação que questiona as regras sobre o acesso e o uso, em processos judiciais, de investigações sobre acidentes aéreos no Brasil.
O processo trata das conclusões sobre as causas dos acidentes, obtidas por investigações técnicas feitas a partir dos destroços. A questão é saber se essas informações podem ser usadas como provas em processos judiciais contra eventuais responsáveis e para a indenização por danos.
O tema é o primeiro item da pauta da quarta-feira e foi incluído na previsão de julgamentos após o acidente com o avião da Voepass em Vinhedo (SP), na última sexta-feira (9).
Outros casos
Os ministros ainda podem analisar o recurso que discute se é possível aplicar o Estatuto do Idoso aos contratos de planos de saúde anteriores à lei.
O Estatuto, na prática, impede a cobrança de valores maiores só porque um segurado ultrapassou os 60 anos. Podem também se debruçar sobre uma ação que discute se uma lei estadual pode obrigar operadoras de internet a informar aos consumidores sobre a velocidade da rede na fatura mensal.
Também devem julgar o processo que discute a permissão, dada por uma lei de 2020, para que cooperativas médicas que operam planos de assistência à saúde usem o regime de recuperação judicial.
Ainda nesta semana, o plenário pode decidir se referenda a decisão individual do ministro Gilmar Mendes, que reconduziu ao cargo o presidente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), Ednaldo Rodrigues.
Além disso, os ministros podem julgar uma ação que discute a exploração do amianto crisotila em uma cidade de Goiás.
Veja abaixo mais informações dos destaques da pauta.
Apurações em acidentes aéreos
A primeira ação em julgamento na quarta-feira (14) é a que discute se as conclusões técnicas obtidas a partir das investigações nos locais de acidentes aéreos são válidas como prova na Justiça.
O processo, apresentado em 2017 pela Procuradoria-Geral da República, trata do material obtido pelas investigações feitas por militares no âmbito do Sistema de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos.
O Sistema está sob a responsabilidade do Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa). Quando ocorre um acidente com aeronaves, como o que ocorreu em Vinhedo (SP), equipes do Cenipa vão ao local onde estão os destroços para verificar as causas.
Uma lei de 2014 alterou o Código Brasileiro de Aeronáutica, prevendo que as conclusões dos técnicos, em regra, não seriam usadas como provas em processos judiciais. A legislação estabeleceu que o uso do material como prova depende de decisão da Justiça. Além disso, restringe o acesso aos destroços das aeronaves acidentadas.
A PGR pontuou que as restrições de acesso ferem princípios constitucionais, como o do devido processo legal, o contraditório e a ampla defesa. Além disso, sustentou que a lei, ao exigir autorização judicial para acessar os dados, interfere no poder de investigação do Ministério Público.
O caso começou a ser julgado em 2021, em ambiente virtual. O relator, ministro Nunes Marques, concluiu que as regras estão de acordo com a Constituição. Um pedido de vista (mais tempo de análise) do ministro Alexandre de Moraes interrompeu o julgamento. Agora, o caso poderá ser retomado em ambiente presencial.
Velocidade de internet
O primeiro item da pauta é uma ação sobre a validade de uma lei de Mato Grosso do Sul, de 2022, que obriga operadoras a informar aos consumidores do estado sobre a velocidade da internet que contrataram (recebimento e envio de dados).
E prevê que quem descumprir está sujeito a sanções do Código de Defesa do Consumidor — entre elas, multa, suspensão de atividade e de fornecimento do serviço.
A ação foi apresentada pela Associação Brasileira de Provedores de Internet e de Telecomunicações em julho do ano passado.
A associação alegou que cabe à União legislar sobre telecomunicações e que a lei estadual, ao estabelecer a medida somente para os consumidores de Mato Grosso do Sul, gera desigualdade no tratamento dos usuários do serviço.
Recuperação judicial para planos de saúde e cooperativas médicas
Está ainda na pauta uma ação da Procuradoria-Geral da República contra uma lei de 2020 que autoriza cooperativas médicas que operam planos de assistência à saúde a utilizar o regime de recuperação judicial.
A recuperação judicial é um mecanismo que permite evitar a falência de uma empresa durante uma crise financeira. Neste processo, a empresa recebe permissão para suspender e renegociar parte de suas dívidas com credores, podendo evitar o encerramento de suas atividades.
O questionamento trata da forma como a lei foi elaborada no Congresso Nacional. Segundo o Ministério Público, a mudança na legislação foi incluída pelo Senado e seguiu para sanção presidencial sem passar por avaliação da Câmara.
Com isso, entende a PGR, a norma é inconstitucional, por irregularidade no processo legislativo.
Aumento de mensalidade de planos de saúde para idosos
O tribunal pode analisar o recurso que discute se é possível aplicar o Estatuto do Idoso aos reajustes de contratos de planos de saúde anteriores à lei.
O debate envolve a regra do estatuto que impede que as operadoras cobrem valores diferentes das pessoas em razão da sua idade (a diferenciação por faixas etárias). Ou seja, na prática, a medida barra o aumento dos planos só porque um segurado ultrapassou os 60 anos.
A disputa jurídica é sobre um contrato entre uma consumidora e uma operadora, firmado em 1999. O acordo previa valores diferentes de mensalidade de acordo com a idade e seguia a Lei dos Planos de Saúde, de 1998. Em 2008, ao completar 60 anos, o valor mensal do plano da segurada foi ampliado em 77%, e a idosa pediu à Justiça a aplicação do Estatuto do Idoso, que entrou em vigor em 2003.
O caso começou a ser analisado no Supremo em 2020, no plenário virtual — formato de deliberação eletrônica em que os ministros apresentam seus votos em uma página do Supremo.
A relatora, ministra Rosa Weber (aposentada), votou para negar o recurso da operadora. Seguiram o entendimento da ministra os ministros Edson Fachin, Ricardo Lewandowski (aposentado), Alexandre de Moraes e Celso de Mello (aposentado).
Os ministros Marco Aurélio Mello (aposentado) e Dias Toffoli divergiram, concluindo que o Estatuto do Idoso não pode ser aplicado a contratos anteriores, por conta da segurança jurídica.
O presidente Luís Roberto Barroso declarou suspeição e o ministro Luiz Fux, impedimento. Um pedido de destaque do ministro Gilmar Mendes levou o caso para análise presencial.
Recondução à presidência da CBF
Ainda na quarta-feira, os ministros podem decidir se referendam a decisão individual do ministro Gilmar Mendes, que reconduziu ao cargo o presidente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), Ednaldo Rodrigues.
A decisão do decano da Corte ocorreu em janeiro deste ano, no âmbito de uma ação do PCdoB.
Rodrigues tinha sido afastado do comando da entidade em 7 de dezembro do ano passado, por decisão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro.
Na ocasião, de forma unânime, três desembargadores do TJ invalidaram um termo de ajustamento de conduta fechado em março de 2022 entre o Ministério Público e a CBF. Esse termo, uma espécie de acordo que alterava o estatuto da CBF, abriu caminho para que Ednaldo Rodrigues, então interino, fosse eleito presidente da entidade.
Na prática, a decisão do tribunal estadual anulou a eleição do dirigente.
Com isso, dias depois, José Perdiz, presidente do Superior Tribunal de Justiça Desportiva, foi indicado para assumir como interventor e organizar novas eleições.
A situação provocou reações contrárias da FIFA e da Confederação Sul-Americana de Futebol, a Conmebol. As entidades condenam intervenções da Justiça comum em federações nacionais de futebol. Por isso, a CBF ficou sob risco de sanções esportivas.
Diante deste cenário, o PCdoB acionou o Supremo pedindo a suspensão da intervenção na CBF. O partido alegou que a situação da entidade, naquele momento, poderia impedir a inscrição da Seleção Brasileira no torneio pré-olímpico, classificatório para os Jogos de Paris.
Relator do caso, o ministro Gilmar Mendes atendeu ao pedido do partido.
Extração de amianto em GO
A Corte pode retomar também o julgamento de uma ação que questiona a lei que viabiliza a extração e o tratamento do amianto crisotila no estado de Goiás, para exportação.
A ação foi apresentada pela Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT) contra uma lei do estado de 2019.
Em 2017, o Supremo já tinha proibido a extração e venda da substância. O tribunal levou em conta a natureza cancerígena do amianto e a impossibilidade de uso seguro do material.
Segundo a ANPT, a lei goiana é posterior à decisão e teve como objetivo garantir a exploração do material em Minaçu, até o fim da lavra. Para a associação, houve desrespeito à decisão de 2017 do tribunal.
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