O procurador-geral de Justiça de São Paulo, Mario Luiz Sarrubbo, abriu nesta segunda-feira (27) um inquérito civil para investigar a conduta do desembargador Eduardo Siqueira, que se recusou a usar máscara de proteção contra o coronavírus e humilhou um guarda civil municipal de Santos, no litoral de São Paulo, no último dia 18.
Segundo o documento, o inquérito pode levar ainda à abertura de uma ação civil para pedido de perda do cargo e cassação de aposentadoria.
Um vídeo obtido pelo G1 mostra o desembargador chamando o guarda de "analfabeto", rasgando a multa por não usar a máscara e jogando o papel no chão e, por fim, dando uma "carteirada" ao telefonar para o Secretário de Segurança Pública do município, Sérgio Del Bel, para que o mesmo "intimidasse" o guarda municipal.
Outro vídeo, gravado em 26 de maio, mostra o mesmo desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo também desrespeitando e ameaçando um inspetor da Guarda Civil Municipal de Santos, ao ser flagrado descumprindo o decreto municipal que obriga o uso de máscaras na cidade.
O procurador-geral cita as duas ocasiões na justificativa para abertura do inquérito para investigar a possibilidade de improbidade administrativa.
"Considerando que a prática das condutas suso descritas caracteriza, em tese, ato de improbidade administrativa, em razão do evidente abuso de poder, e malferimento aos deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade e lealdade às instituições [...] instauro, nos termos do artigo 106 da Lei Complementar Estadual nº 734/93, do artigo 19 do Ato Normativo nº 484/06-CPJ, inquérito civil para a completa apuração dos fatos", diz Sarrubbo no documento.
Siqueira terá 15 dias para apresentar sua defesa, após a notificação de abertura do inquérito. De acordo com levantamento do TJ-SP, o desembargador já foi alvo de outros 42 procedimentos disciplinares.
CNJ abre reclamação
O corregedor nacional de Justiça, ministro Humberto Martins, já havia determinado neste domingo (26), a abertura de uma reclamação disciplinar contra o desembargador. Desde a semana passada, Siqueira já era alvo de uma apuração preliminar no Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
O desembargador paulista também terá 15 dias para apresentar sua defesa ao conselho. Há expectativa de o plenário do CNJ discutir o caso de Siqueira no dia 25, quando pode ser aberto um processo administrativo disciplinar.
Para o corregedor, Siqueira pode ter ferido a Lei Orgânica da Magistratura, o Código de Ética da Magistratura, e ainda a lei de abuso de autoridade e cometido desacato a autoridade.
O que diz o desembargador
Em nota divulgada após a repercussão das imagens, o desembargador Eduardo Siqueira afirmou que o vídeo é verdadeiro, mas alega que foi tirado de contexto e diz ter sido vítima de "armação". Para ele, a determinação por decreto do uso de máscaras em determinados locais é um abuso.
No texto divulgado, Siqueira explica que “decreto não é lei” e que, por isso, entende não ser obrigado a usar máscara, e que qualquer norma que diga o contrário é “absolutamente inconstitucional”. Ele alega que esse não foi o primeiro incidente que aconteceu entre ele e agentes da Guarda Civil Municipal, e que em todas as ocasiões foi ameaçado de prisão de modo agressivo, justificando a exaltação.
Na última quinta-feira (23), ele pediu desculpas e afirmou que "nada justifica os excessos" dos quais estava arrependido.
"Nos últimos dias, vídeos de incidentes ocorridos entre mim e guardas municipais de Santos têm motivado intenso debate na mídia e nas redes sociais, com repercussão nacional. Realmente, no último sábado (18/07) me exaltei, desmedidamente, com o guarda municipal Cícero Hilário, razão pela qual venho a público lhe pedir desculpas", afirmou.
"Minha atitude teve como pano de fundo uma profunda indignação com a série de confusões normativas que têm surgido durante a pandemia – como a edição de decretos municipais que contrariam a legislação federal – e às inúmeras abordagens ilegais e agressivas que recebi antes, que sem dúvida exaltam os ânimos. Nada disso, porém, justifica os excessos ocorridos, dos quais me arrependo. O guarda municipal só estava cumprindo ordens e, na abordagem, atuou de maneira irrepreensível. Estendo as desculpas a sua família e a todas as pessoas que se sentiram ofendidas", completou.
O Tribunal de Justiça de São Paulo já havia se manifestado em nota sobre o acontecimento e informou que determinou a imediata instauração de procedimento de apuração dos fatos, requisitou a gravação original e ouvirá, com a máxima brevidade, os guardas civis e o magistrado.
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