A Polícia Militar (PM) expulsou neste mês da corporação o cabo Victor Cristilder Silva dos Santos e os soldados Fabrício Emmanuel Eleutério e Thiago Barbosa Henklain, condenados pela Justiça a mais de 600 anos de prisão, na soma das suas penas, por envolvimento na maior chacina que se tem conhecimento no estado de São Paulo.
Em agosto de 2015, 23 pessoas foram executadas a tiros por homens encapuzados na Grande São Paulo. No dia 8 daquele mês, seis foram assassinadas em Itapevi, Carapicuíba e Osasco. No dia 13, mais 17 foram baleadas e mortas em ataques cometidos em Osasco e também em Barueri --câmeras de segurança gravaram essas últimas execuções.
De acordo com a acusação feita pelo Ministério Público (MP), todas as mortes aconteceram em represália aos assassinatos do policial militar Admilson Pereira de Oliveira, em 8 de agosto de 2015 em Osasco, e do guarda-civil Jeferson Luiz Rodrigues da Silva, em Barueri no dia 12 de agosto daquele ano.
A Promotoria alegou que outros agentes de segurança trocaram mensagens por celular combinando os crimes para vingar as mortes dos colegas de farda. Alguns dos alvos tinham ficha criminal.
17 mortes em Osasco e Barueri
Os três policiais expulsos da PM foram acusados de matar 17 pessoas e ferir outras sete no dia 13 de agosto de 2015 em Osasco e Barueri. Além deles, um guarda-civil de Barueri também foi condenado pelos assassinatos.
A decisão de expulsar os agentes da PM foi publicada no último sábado (20) no Diário Oficial do Estado de São Paulo.
Segundo o documento, a expulsão do trio da corporação se justifica pelo "cometimento de atos atentatórios à instituição, ao Estado, aos direitos humanos fundamentais e desonrosos, consubstanciando transgressão disciplinar de natureza grave".
1º julgamento
No primeiro julgamento do caso, em 2017, a Justiça condenou Fabrício Eleutério, soldado das Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar (Rota), tropa de elite da PM paulista, a 255 anos, 7 meses e 10 dias de prisão pelas 17 mortes e sete tentativas de assassinatos.
No mesmo julgamento, o soldado Thiago Henklain, do 42º Batalhão da PM (BPM), foi condenado a 247 anos, 7 meses e 10 dias de prisão pelos mesmos crimes.
Ainda nesse júri, Sérgio Manhanhã, agente da Guarda Civil Municipal de Barueri, também foi julgado e condenado. Recebeu pena de 100 anos e 10 meses por participação nos crimes.
Todos os três condenados negaram os crimes e alegaram inocência.
2º julgamento
No segundo julgamento do caso, o cabo do 20º BPM Victor Cristilder foi condenado em 2018 a 119 anos, 4 meses e 4 dias de prisão por 12 das mortes e quatro tentativas de assassinatos. Assim como os outros colegas, ele também se disse inocente das acusações.
Os quatro agentes ainda foram condenados por formação de quadrilha. Apesar de receberem penas que ultrapassam o período de um século de prisão, pela lei brasileira nenhum deles poderá ficar mais de 30 anos preso.
TJ julga recurso
A decisão administrativa da Polícia Militar de expulsar os três agentes ocorre quase uma semana antes do julgamento dos recursos dos policiais e do guarda-civil no Tribunal de Justiça (TJ) de São Paulo, marcado para esta quarta-feira (24). As defesas de cada um deles pedem a anulação dos julgamentos que os condenaram pela chacina.
A expulsão dos PMs, no entanto, é um processo administrativo da corporação, independente da condenação deles na Justiça.
“A expulsão, na minha opinião, teve o condão de causar obstáculo ao exercício da defesa, na clara tentativa de influenciar negativamente os desembargadores que irão julgar o recurso de quarta”, disse nesta terça-feira (23) ao G1 o advogado de Victor Cristilder, João Carlos Campanini.
Os pedidos para anular os júris serão avaliados por desembargadores da 7ª Câmara Criminal do TJ a partir das 13h. Se os magistrados atenderem às solicitações das defesas para anular os júris, os três ex-PMs e o guarda poderão ser soltos até que se sejam marcados novos julgamentos.
“Amanhã [quarta-feira] será julgada a apelação do júri. Pedimos para anular a condenação e dar o direito a ele a ser julgado novamente, em novo júri”, afirmou João Campanini.
Para o advogado Fernando Capano, que defende Thiago Henklain, a decisão da PM em expulsar os agentes é "ilegal".
"A expulsão dos policiais está baseada em fatos apurados no âmbito do processo crime, e apenas neles", declarou Fernando Capano. "Se considerarmos a lógica do princípio da inocência até prova em contrário, seria aguardar o trânsito em julgado do processo crime para apenas a partir daí se fazer juízo disciplinar acerca do caso."
Na opinião da advogada Flávia Artilheiro, que faz a defesa de Fabrício Eleutério, a decisão do processo administrativo surpreendeu a todos. "Não apenas por contrariar o relatório do conselho processante, mas principalmente por se dar às vésperas do julgamento, com claro viés político e o intento de influenciar no deslinde da causa", disse ela.
Até a publicação desta reportagem, os três condenados pela Justiça continuavam detidos no Presídio Militar Romão Gomes, na Zona Norte da capital, mesmo após terem sido expulsos da corporação.
Apesar disso, existe a possibilidade de que eles sejam transferidos para um presídio comum que tenha vagas para ex-policiais, por questão de segurança. O guarda está detido em Tremembé, interior paulista.
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