A “Chacina de Tapera”, como ficou conhecido um triplo homicídio ocorrido no município de São José da Tapera, em 1984, completou 33 anos no último dia 10 de janeiro. O episódio vitimou o pré-candidato a prefeito da cidade, Wellington Pinto Fontes, e outras duas pessoas.
O fato entrou para a história como mais um crime de mando político do Sertão, mas, nos últimos anos, caiu no esquecimento popular.
O ex-vereador, advogado, contador e professor de Educação Moral e Cívica Wellington Fontes tinha 32 anos em 1984. Na época, ele era pré-candidato a prefeito de São José da Tapera pelo PMDB. Porém, disputar um cargo majoritário no Sertão de Alagoas nos anos 1980, quando não se tinha o apoio dos coronéis da época, era uma atitude de risco.
Mesmo assim, Wellington Fontes encarou o desafio. Conforme relatos dos jornais daquele período, ele advertia para o coronelismo que ainda imperava na cidade, o grande número de gente que andava armada sem permissão e o descaso de um delegado, que pedia votos para o candidato do prefeito. O cenário na cidade era de um verdadeiro “Velho Oeste” de filme americano.
Carta ao presidente da República alertou sobre coronelismo
Em 1981, segundo os jornais alagoanos publicaram na época, o advogado e também ex-vereador João Alves da Silva, mais conhecido como “João de Mércia”, e Wellington Fontes enviaram uma carta ao presidente da República, João Batista Figueiredo, denunciando o prefeito de Pão de Açúcar da época, Elísio Maia, que era pai do prefeito de São José da Tapera, Hermes Maia, por se utilizar do poder econômico “para dar cobertura a barbaridades e ferir a própria abertura (política) tão pregada e praticada por Vossa Excelência (o presidente)”.
A carta, na qual eles pediam que fosse “evitado o pior”, talvez já prevendo que podiam ocorrer conflitos armados, foi entregue ao presidente quando ele visitava a cidade de Delmiro Gouveia. Porém, os taperenses nunca obtiveram resposta.
A noite da chacina na Churrascaria Brasília
Na noite de 10 de janeiro de 1984, ano em que haveria eleições municipais, por volta das 19h40, Wellington Fontes e João Alves, acompanhados de amigos, estavam na Churrascaria Brasília, que fica às margens da AL-220, na entrada da cidade de São José da Tapera, após voltarem de um jogo de futebol.
Enquanto isso, a esposa de Wellington Fontes, dona Maria Auxiliadora Fontes, servia café a seus quatro filhos, que tinham 7, 6, 4 e 2 anos de idade.
Ao mesmo tempo, na churrascaria, Antônio José dos Santos, mais conhecido como “Toinho da Barra”, Sérgio Caetano da Silva e Orlando de Almeida Carvalho, supostamente a mando do então prefeito de Pão de Açúcar, Elísio Maia, segundo a representação do delegado especial Francisco Pinheiro Tavares, cercaram o local e mataram a tiros de metralhadora e espingarda calibre 12 o agricultor Givaldo Ferreira dos Santos, o advogado João Alves e o pré-candidato a prefeito Wellington Fontes.
De acordo com uma reportagem do jornal Tribuna de Alagoas, do dia 20 de janeiro de 1984, Wellington Fontes recebeu 158 perfurações de chumbo de espingarda calibre 12 e metralhadora.
Pedido de prisão de Elísio Maia e delegado exonerado
Na mesma reportagem do dia 20 de janeiro de 1984, o jornal Tribuna de Alagoas informa que o tenente da reserva Pedro Araújo da Silva, que na época da chacina atuava como delegado em São José da Tapera, foi exonerado do cargo por suspeita de participação direta ou indireta no crime. Ele chegou a ser indiciado em inquérito.
Para substituí-lo no cargo, o secretário de Segurança Público do Estado, Ardel Jucá, indicou o tenente José Agamenon Oliveira da Silva. O governador de Alagoas no ano da “Chacina de Tapera” era Divaldo Suruagy.
A reportagem afirma ainda que o então prefeito de Pão de Açúcar, Elísio Maia, tido como um dos “coronéis” do Sertão, foi apontado como o mandante da chacina e teve a prisão decretada pela Justiça.
O pedido de prisão divulgado pelo jornal Tribuna de Alagoas ressalta o seguinte: “A respeito do primeiro representado, Sr. Elísio da Silva Maia, apontado como sendo autor intelectual dos ilícitos penais aqui noticiados, convém salientar tratar-se de pessoa de reconhecida influência política e social, além de possuir privilegiada situação econômica, no município de São José da Tapera, a sua liberdade influirá induvidosamente na colheita de prova testemunhal, prejudicando a elucidação dos fatos que levarão à conclusão da responsabilidade penal que lhe vem sendo imputada”.
Réus foram inocentados
Em outubro de 1984 – nove meses após a “Chacina de Tapera” – o Tribunal de Justiça de Alagoas inocentou todos os acusados pelo crime, entre eles o então prefeito de Pão de Açúcar, Elísio Maia.
Na ocasião, segundo reportagem do dia 19 de outubro de 1984 do extinto Jornal de Alagoas, o desembargador Olavo Cahet, que presidiu uma das Câmaras Criminas do Tribunal de Justiça, anunciou a impronúncia dos réus. A pronúncia para os acusados havia sido decretada pelo juiz de Olho D’água das Flores, Aderbal Mariano, que também respondia por São José da Tapera.
A reportagem diz ainda que os três desembargadores da época, sendo eles Olavo Cahet, Benedito Barreto Acioly e o relator José Marçal Cavalcanti, por unanimidade de votos, decidiram pela despronúncia e alegaram que “nos autos não existem provas contra as pessoas que foram acusadas na Comarca de Olho D’água das Flores”.
Após a decisão do TJ/AL, proferida no dia 18 de outubro de 1984, as viúvas e outros parentes das vítimas seguiram para a Câmara de Vereadores de Maceió, onde presenciaram o vereador Freitas Neto, que era também advogado e jornalista, lamentar a decisão da Justiça alagoana e tecer durar críticas ao crime organizado no Estado.
Locais públicos homenageiam réus e vítimas
Em São José da Tapera, se não fossem alguns locais públicos que homenageiam as figuras políticas envolvidas na chacina de 1984, o caso estaria esquecido pela maioria da população.
Dessa forma, os mais curiosos podem se questionar quem foi Elísio da Silva Maia, que dá nome à principal avenida da cidade, onde ficam a Câmara de Vereadores, parte do comércio e as maiores praças públicas, ou Wellington Pinto Fontes, que dá nome a uma escola pública municipal.
Confira abaixo a reprodução de algumas reportagens do ano de 1984 publicadas nos jornais Tribuna de Alagoas e Jornal de Alagoas sobre a "Chacina de Tapera".
Entrada de São José da Tapera, mais de três décadas após a chacina que vitimou o pré-candidato a prefeito Wellington Fontes (Foto - Diego Barros) |
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