A Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu nesta terça-feira (20), por unanimidade, conceder prisão domiciliar a presos preventivos que sejam os únicos responsáveis pelos cuidados de crianças menores de 12 anos e de pessoas com deficiência. Cada caso será julgado individualmente.
Na prática, a decisão estende aos homens em prisão preventiva (sem condenação definitiva) o benefício que já tinha sido autorizado, em 2018, às presas grávidas ou mães de crianças menores de 12 anos ou com deficiência.
O novo entendimento também pode beneficiar outros presos que, mesmo não sendo pais ou mães, demonstrem ser imprescindíveis para o sustento de menores de 6 anos ou de pessoas com deficiência.
Os ministros acompanharam o voto do relator Gilmar Mendes. O ministro estabeleceu que a concessão da prisão domiciliar será a regra, desde que cumpridas as seguintes exigências:
Cada caso deverá ser analisado individualmente. A Justiça vai analisar inclusive se estão presentes os requisitos para a concessão domiciliar previstos no Código de Processo Penal. Se houver dúvida, audiências podem ser convocadas para esclarecer os documentos trazidos aos casos.
É preciso que a defesa dos presos demonstre que os pais que postulam o benefício são os únicos responsáveis por menores de 12 anos e de pessoas com deficiência. Se a relação de parentesco for outra, é preciso provar que o detento é imprescindível para o sustento de menores de 6 anos e de pessoas com deficiência.
Não podem ser beneficiadas pessoas presas por crimes cometidos com violência ou grave ameaça, nem por delitos cometidos justamente contra os dependentes que justificariam a domiciliar.
Mendes determinou ainda mecanismos para que o cumprimento da decisão possa ser verificado – entre eles, o acompanhamento por parte do Conselho Nacional de Justiça e o fornecimento de informações, pelos tribunais, sobre a concessão do benefício em 45 dias.
A depender dos dados dos tribunais, uma nova avaliação pode ser feita e outras medidas podem ser tomadas.
Histórico
O pedido foi inicialmente apresentado por um escritório de advocacia, mas ao longo do processo a Defensoria Pública da União passou a participar da ação.
Um dos argumentos apresentados no pedido é o de que, sem os cuidados destes adultos, crianças e pessoas com deficiência têm violados direitos como a dignidade humana e a igualdade. Haveria, no caso, uma discriminação em relação àqueles cujas mães foram beneficiadas.
Em abril de 2019, o Conselho Nacional de Justiça informou, nos autos do processo, que havia 31.841 pessoas presas nas circunstâncias apontadas pela ação, mas ressaltou que o número não refletia a quantidade de pessoas presas naquele momento. Isso, porque o número poderia incluir prisões já revogadas, relaxadas ou já transformadas em pena.
Sessão
No julgamento desta terça-feira, o defensor público federal Gustavo de Almeida Ribeiro apontou que a pandemia do coronavírus tornou a demanda urgente, por conta das necessidades de isolamento social.
O subprocurador da República, José Elaeres Marques Teixeira, opinou pela concessão da medida, mas ressaltou que os casos devem ser analisados individualmente.
Relator do caso, o ministro Gilmar Mendes apresentou números de presos no Brasil: segundo o CNJ, existem 861.373 presos; destes, 369.677 estão em prisão provisória. Ao votar a favor da medida, o ministro ressaltou que o foco dela deve ser os presos de baixa periculosidade e a Justiça deve analisar casa caso concreto.
Também argumentou que a decisão não significa ativismo judicial, já que o Código de Processo Penal permite a concessão da prisão domiciliar, preenchidas certas condições.
"Destaco que a execução desta decisão deve ser realizada de forma diligente, verificando-se as peculiaridades de cada caso, cabendo ao magistrado justificar os casos excepcionais onde as situações de riscos sociais ou do processo exijam a fixação de outras cautelares, inclusive a manutenção da prisão preventiva", determinou o ministro.
Acompanhando o voto do relator, o ministro Edson Fachin também afirmou que a medida não poderia beneficiar presos por crimes com violência e por delitos contra menores e outros dependentes.
Fachin ressaltou ainda que não se trata de uma revogação automática das prisões preventivas, já que cada caso individual será avaliado.
"A realidade concreta sugere, mais que sugere, impõe a priorização redobrada aos direitos da criança e da pessoa com deficiência", afirmou Fachin.
A ministra Cármen Lúcia argumentou que crianças e pessoas com deficiência acabam também por sofrerem os impactos da prisão de familiares. "Quem é condenado e que cumpre a pena não é quem é punido sozinho".
O ministro Ricardo Lewandowski afirmou que o voto do ministro Gilmar Mendes ajuda a efetivar direitos previstos na Constituição aos jovens. "É dever da família e da sociedade, do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, saúde, alimentação, educação, ao lazer, profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade, à convivência familiar e comunitária".
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