Italo Calvino (1923-85) escreveu “As Cidades Invisíveis” em 1972. O livro tornou-se imediatamente um clássico absoluto da Literatura Universal, e com apenas 147 páginas! No Brasil, foi publicado pela Companhia das Letras, entrou no plano FNDE e está presente na maioria das bibliotecas das escolas públicas, desde 2011. Sim, o vi em escolas, está lá, na estante, e aparentemente intacto, nunca talvez folheado, pelo que percebi. Por que digo isto? Uma provocação literária! Ora, como ainda não se percebeu a existência deste livro de rara beleza!?
Italo Calvino, um contador extraordinário de fábulas, nasceu em Cuba, cresceu na Itália. Formou-se em Letras, publicou na revista L’Espresso, no jornal L’Unità, no periódico La Repubblica. Seus livros foram publicados pela editora Einaudie. Se opôs às brutalidades do seu tempo, a exemplo da Segunda Guerra Mundial.
Em “As Cidades Invisíveis” o autor cria um diálogo entre o navegador veneziano Marco Polo e o imperador tártaro Kublai Khan, para narrar acerca dos problemas do mundo e da esperança humana. Na verdade, Calvino toma emprestada a voz de Marco Polo para dizer coisas grandiosas ao nosso espírito humanista. Neste livro de ficção o método é de contrastes e de inversões; a narrativa fabular aponta a pontos extremados: ao bem e ao mal; ao amor e à indiferença; à boa e à má consciência; à atitude moral e ética frente à autodescoberta e às escolhas mínimas — a partir da “viagem existencial” de cada um — em oposição a tudo aquilo que o mundo, isto é, a cidade tem em excesso: “Os outros lugares são espelhos em negativo. O viajante reconhece o pouco que é seu descobrindo o muito que não teve e o que não terá”.
As pequenas narrativas deste livro transitam num jogo entre a memória apaixonada, que evoca um passado vivo, e a presença da cidade e de seus moradores no aqui e agora, porque “de uma cidade, não aproveitamos as suas sete ou 77 maravilhas, mas a resposta que dá às nossas perguntas”.
A personagem de Marco Polo tratará, entre lembrança e esquecimento, alguns valores nobres de convivência consigo e com o Alteridade em geral. E assim, Calvino ainda alude àquela metáfora de esperança, especialmente à pessoa honesta, que insiste na honestidade, “mesmo que o mundo se acabe”, ou quando quase todos jazem no erro.
O livro não nos traz histórias de esperanças simples, mas da certeza de um fazer a própria vida, firme na espera por aquilo que decerto virá, arranjando seu próprio espaço interior, como lugar de estadia do bem, e sem ilusões: “Para descobrir quanta escuridão existe em torno, é preciso concentrar o olhar nas luzes fracas e distantes”.
Calvino sabia que tais “luzes fracas e distantes” não são inalcançáveis e impossíveis. Ele sabia que estas luzes residem no espírito de cada ser vivente, e desde sempre — cabe a cada um de nós aceitá-las e cultivá-las, ou mesmo denegar-se à Luz.
Porquanto, o autor utiliza a voz de Marco Polo, para nos apresentar um último e grande ensinamento. Leiamos na íntegra: O inferno dos vivos não é algo que será; se existe, é aquele que já está aqui, o inferno no qual vivemos todos os dias, que formamos estando juntos. Existem duas maneiras de não sofrer. A primeira é fácil para a maioria das pessoas: aceitar o inferno e tornar-se parte deste até o ponto de deixar de percebê-lo. A segunda é arriscada e exige atenção e aprendizagem contínuas: tentar saber reconhecer quem e o que, no meio do inferno, não é inferno, e preservá-lo, e abrir espaço.
Enfim percebemos de imediato que “As Cidades Invisíveis” é um livro que após sua leitura fará somar bastante a nossa vida interior.
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