Leo Barth, nasceu em 1984. Delmirense dividido entre sertões e capital do caos. Começou a escrever por causa da Teologia. “Homem que nasceu morto, e que se acha em cada esquina, poeta de bêbados e esquizofrênicos, delimitado pelo caos particular, e autor de nada”. É notável entre os novos poetas trágicos-febris, um dos nossos maiores poeta do Underground alagoano. Tem uma filosofia existencial-literária parecida com o grande Macedônio Fernandez, que escrevia compulsivamente sem muito importar-se com publicações. Boêmio, Machadiano e acadêmico, o autor possui centenas de poemas inéditos, produzindo-os desde 2001. É co-fundador do grupo “Arborosa”, de poesia, arte visual e fotografia, e editor do staff da Edições Parresia. Publicou na Utsanga (Itália) revista de poesia experimental, e em revistas brasileiras.
Este poeta louco é o anti-herói ficcional e heterônomo do Leonardo Rodrigues Simião Pereira. Como sujeito inquieto e australoboteco, emergiu da Underground pós-moderno e daí transcendeu. Saiu do interior das Alagoas para estudar na capital (e por lá descobriu que sua alma também é cínica (no sentido clássico, de Diógenes de Sinope), como as fachadas duras dos edifícios do centro corroído pela maresia). Descobri-o como escritor em 2014, no Facebook, onde publicava seus poemas estrepitosos, seus aforismos e sentenças sobre o mundo, sobre política, religião, nihilismo, literatura, cinema, no senses e também alusões à sua personalidade multifacetada, em que realidade, ficção e destilados amalgamam-se: “Mas ele é um ‘demo’ que assume paixão por algumas paixões humanas, e algumas vezes se faz visto, outras, penso que se faz invisível na sociedade.”. Leo Barth define assim seu avatar, no escopo, talvez, de precisar a condição ontológica do humano em relação ao mundo atual, como possibilidade de sanar demandas que transcendem a lógica conhecida:
Esses dias acabei esbarrando na série baseada no conto do Neil Gaiman, “American Gods” que apresenta entidades sobrevivendo na pós-modernidade... Tem uma que apresenta um certo instinto de abate, o Czernobog que acabei colocando na foto do perfil [do Facebook]. Mas foi uma descoberta pós Barth (2014).
Sobre sua poesia não é possível tratá-la devida e satisfatoriamente sem utilizar-se de amplo estudo, hoje necessário, eu afirmo. Todavia, me atrevo desafiadamente a discorrer acerca de uma das quais gosto bastante, a “Certo dia, esquizofrenia” (p.63 do seu livro, " Garagem do Parasíso"), que se segue abaixo, e talvez, quem sabe, ainda recitada, em tom solene, por uma espécie de Czernobog alagoano iniciado nos versos de Poe:
Certo dia acordei com meu cadáver na cama/ Pensei um sonho, convulsão ou droga colorida/ —seco/ Era dia frio e às vezes chovia/Comecei a tomar café (suas pernas ou minhas pernas) levemente dobradas/e o rosto nas sombras/A morte sorria a olhar o teto manchado/Como linda prostituta com roupa eclesiástica/Alisando um boi sentado como cão de guarda/Babando compulsivamente /De lá pra cá misturo as verdades.
O poeta abre o verso afirmando: “Certo dia acordei com meu cadáver na cama”. Me assombro com a potência ultrarrealista da sentença — de trazer o futuro irremediável, a “morte”, ao presente, e vê-la racionalmente em seu corpo que ainda desperta, mas que já traz (desde o nascituro) os sinais-para-o-fim; me choco ainda mais por esse tratamento kafkiano, por essa análise franca, que se permite perder-se na e retornar da loucura, deste estado “alterado” da consciência, deste buraco onírico: “Pensei um sonho, convulsão ou droga colorida/ —seco”. E sobre o que pensou o poeta adjetiva “—seco”, talvez no sentido de “vazio” (de uma garrafa oca, de que fora cheia de uma “cerveja recheada?”), talvez também no sentido existencial de “dureza”, de “rudeza”. O poeta diz uma só palavra de desfecho: “—seco”, e nos tira a venda.
Entrevista elaborada entre 2014 e 2019
Amancio – Entre ficção e realidade, qual o papel do autor?
Barth – A coisa flui como heterônimo carniceiro que às vezes se faz presente à pena. Uma personalidade que emaranha no inconsciente e não vem com frequência ou algo desejado.
Amancio – Me diz em uma metáfora o que este autor.
Barth – Ao escrever acabo descobrindo mais sobre Barth, como um daimon aposentado que vaga à boemia, por vezes, e ou em algum trabalho, acaba abatendo bois por diversão...
Amancio – Qual o atual o objetivo desse heterônimo carniceiro?
Barth – Por certo, não preencher apenas espaço na comuna. Mas relatar um certo “ódio” pelo sagrado, embora admita em alguns versos que, pela hierarquia subangélica, deva manter o respeito. Uma vez que está “aposentado” desde o medievo (posição que denota minha relação de apreço, como historiador, pelo período).
Amancio – Sei que há o trânsito do poeta-ente-autor (o Barth), entre ficção e realidade, e há níveis de realidade em intersecção com a ficção (a embriaguez alcoólica — “realidade ficcional” induzida “ternamente”) que repercutem em sua escrita e em suas técnicas...
Barth – Às vezes penso numa tensão entre heterônimo e pseudônimo na mesma figura. Mas, como afirmei, penso na escrita em sua “independência” de confecção baseada no subconsciente. Diferente da técnica de “cut-up” que delineio versos recortados, quase instantâneos, sem muita “lógica” aparente, mas, que por fim se explicam com começo, meio e fim de alguma história.
Amancio – Por que da escolha de um discurso em forma de poemas?
Barth – O discurso surge como explosão, necessidade de comunicação urgente no papel, uma vez que, por ser absurdo soaria bem estranho como forma de confissão auricular a algum amigo (risos!).
Amancio – Quais autores te influenciaram?
Barth – O Bukowski e Casimiro de Abreu, Álvares de Azevedo, com base nas loucuras poéticas do Lord Byron; Rimbaud com seu simbolismo. “Uma temporada no inferno” possibilitou manusear as chaves simbólicas do meu inferno. O Bukowski como andarilho que se deu mal em muita coisa, mal parou em empregos, sexo, cana e doideiras. Mas priorizou sua arte e a fez com maestria a escrever, quase exclusivamente, sobre si como troco à escuma do mundo.
Amancio – E sua relação com a poesia tradicional?
Barth – Sempre fui avesso à métrica bem definida e religiosa parnasiana.
Amancio – Você leu muito a poesia tradicional?
Barth – Do colegial tive apreço pela segunda geração romântica; o Satanistischer Kern, devidamente entendido como liberdade, celebração das sombras como algo estético, poético, de protesto, e não, necessariamente como “subdivindade”. Acabei não citando meu apreço pelo realismo. Machado de Assis é minha leitura obrigatória, ácido, sarcástico e preciso nas facadas morais que tece a sociedade de seu tempo. Embora não aponte soluções com seu pessimismo sobre o gênero humano.
Amancio – Me disseram que você curte poesia beat, haicais e outras viagens.
Barth – Sim, a poesia beat, surge como marco divisor desta nossa boemia a apreciação mística oriental, por exemplo, do Kerouac. E, exatamente com Kerouac veio o apreço pelo haicai. Paradoxalmente, despertando até a confecção na métrica 5-7-5, ou livre com temática tradicional, ou não.
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