Completam-se dois meses neste sábado (28) que a Fábrica da Pedra, localizada em Delmiro Gouveia, parou de funcionar por causa do corte de energia elétrica em todo o parque industrial. A indústria têxtil não está conseguindo quitar um débito milionário com a Eletrobras Distribuição Alagoas.
Sem ter condições de funcionar e nem de pagar o débito com a concessionária de energia, a solução encontrada pela diretoria da fábrica foi colocar, no dia 1° de abril deste ano, os 583 funcionários em férias coletivas. A expectativa era de que o problema fosse resolvido em até um mês, quando houvesse um parcelamento da dívida com a Eletrobras, o que não ocorreu.
Segundo o diretor executivo da fábrica, Luiz Anhanguera Lessa, a previsão é que a unidade volte a funcionar em julho deste ano. “Não adianta voltar por voltar, temos que voltar para brilhar. E vamos, tenho certeza disso. Continuo acreditando na fábrica e em nossos colaboradores. Tenho certeza que juntos iremos escrever mais um capítulo de vitórias. Com Deus à frente e muito trabalho, vamos virar esse jogo”, disse.
Atualmente a Fábrica da Pedra, que completa 102 anos no próximo dia 5 de junho, está funcionando apenas com a vigilância patrimonial.
Início da crise e negociações
Na época em que ocorreu o último corte de energia, em uma reunião em Maceió, a diretoria da fábrica explicou que não havia condições da indústria quitar à vista o débito de R$ 1.265.000,00 e solicitou um parcelamento de 36 vezes, mas a concessionária não aceitou as condições do pedido, contrapropondo a divisão da dívida em apenas quatro parcelas.
A fábrica tinha duas faturas de energia vencidas, uma no valor de R$ 735 mil referente ao mês de fevereiro e outra de R$ 530 mil correspondente a março. A energia foi cortada quando apenas a primeira fatura estava atrasada, o que para a diretoria da indústria se tratou de uma intransigência da Eletrobras.
O fato é que, antes disso, a indústria já vinha com dificuldades financeiras. Em fevereiro deste ano, o fornecimento elétrico também foi cortado por falta de pagamento e, por conta disso, a fábrica parou, mantendo apenas parte do funcionamento por meio de geradores elétricos. O Museu da Pedra, pertencente à indústria, também ficou sem energia.
A situação já era complicada até mesmo antes da energia ter sido cortada. A indústria já vinha parando o setor de tecelagem, três ou quatro dias por semana, por falta de demanda no estoque. Quando isso ocorria, os trabalhadores do setor ficavam parados, cumprindo o horário de trabalho sem fazer nada.
Diretor executivo da Fábrica da Pedra, Luiz Anhanguera Lessa (foto: Jota Silva) |
De acordo com o diretor executivo da fábrica, Luiz Anhanguera Lessa, a indústria começou a sentir os efeitos da crise, que ele classifica como política/econômica, já em janeiro de 2015. “Já naquele momento, grandes indústrias iniciaram um forte movimento de retração, reduzindo produção, dando férias coletivas, demitindo, e outras fechando as portas. Aqui na fábrica não foi diferente, só que a estratégia adotada tinha como foco sobreviver”, disse.
“Ora, se você entra na guerra e de cara já usa toda sua artilharia pesada, o que pode acontecer? Bem provável que acabe sua munição antes do fim e você morra”, analisou Anhanguera, se referindo às empresas que no início da crise optaram por conceder férias coletivas e suspender temporariamente as atividades e demissões. “Essas hoje estão fechadas”, concluiu.
Para explicar a situação, o diretor relatou a trajetória financeira da indústria durante os últimos cinco anos. “Quando assumi a direção, em 2010, a fábrica faturava R$ 65 milhões por ano. A partir de 2012 até 2014, o faturamento foi elevado para R$ 85 milhões, fazendo com que a indústria voltasse a crescer”, disse.
Conforme Luiz Anhanguera, a decisão da diretoria da Fábrica da Pedra foi lutar contra a crise, tomando as medidas possíveis e sempre se resguardando para que no momento certo fossem adotadas as ferramentas outrora escolhidas pelas empresas que não conseguiram sobreviver. “Foi isso que ocorreu. Estamos utilizando todas as ferramentas normais de gestão para enfrentar uma crise. E ainda estamos vivos, com os salários em dia, mesmo sem funcionar, disse.
Impacto no comércio e medo de demissões
O comércio local sente o impacto do não funcionamento da fábrica. “Estamos sem saber o que fazer. Com a fábrica funcionando, o negócio já estava ruim, mas não como está agora. Por insegurança financeira, as pessoas que estão em férias coletivas deixaram de comprar e os familiares que dependem delas também“, disse o proprietário de uma loja de calçados e confecções instalada na cidade, que não quis se identificar.
Aqueles que estão em férias coletivas temem que a fábrica não consiga se reerguer e que, com isso, percam os empregos. “Pensei que iria ficar em casa apenas um mês, no máximo, mas já estamos há 60 dias sem trabalhar. Tem muita gente que está curtindo as férias, mas eu queria mesmo era estar trabalhando para contribuir com o progresso da fábrica e, assim, garantir meu emprego”, disse um jovem de 22 anos de idade, que trabalha no setor de tecelagem.
O ex-funcionário Zeca Queiroz, que trabalhou durante 36 anos na fábrica, disse que a indústria já conseguiu superar outras crises graves, como a que culminou no suicídio do diretor Antônio Carlos Menezes e no assassinato do fundador Delmiro Augusto da Cruz Gouveia. “Durante o tempo em que trabalhei na fábrica, nunca vi uma crise tão devastadora como esta. Antes o principal problema era somente o mercado, agora também é de gestão de governo”, disse.
Indústria têxtil está localizada no centro da cidade de Delmiro Gouveia (foto: Grupo Carlos Lyra) |
A fábrica
Fundada no dia 5 de junho de 1914 pelo industrial Delmiro Augusto da Cruz Gouveia, a Fábrica da Pedra S/A Fiação e Tecelagem foi adquirida pelo Grupo Carlos Lyra em 1992. É uma indústria prestes a completar 102 anos, que tem contribuído para o desenvolvimento econômico e social do Sertão de Alagoas e do restante do país.
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